Boris Vian ( 1920-1959), além de escritor foi
músico notável. Tocava sobretudo jazz, dedicando inúmeros escritos ao
tema. Em 1946, publicou o romance J´irai cracher sur vos tombes
(Cuspirei sobre seus túmulos), que trata
da violência e do racismo, provocando enorme escândalo. L´écume des
jours (1947) tornou-se uma de suas obras mais conhecidas e teve boa
acolhida de Raymond Queneau e de Jean-Paul Sartre. Queneau afirmou tratar-se da
história de amor mais pungente do tempo. O sucesso de público, porém,
veio apenas no final dos anos 1960.
Outro texto célebre é o poema "Le
déserteur" no qual o autor revela sua aversão pela guerra. O caráter
anti-militarista dos versos provocou sua proibição durante vários anos.
Durante a guerra do Vietinã, "Le déserteur" tornou-se hino pacifista.
Muito provavelmente Boris Vian redigiu o texto em
vinte e quatro horas. O músico e poeta compõe também a melodia, ao contrário da
maior parte de suas composições nas quais ele assina apenas a letra. Fruto de
uma época ainda fortemente marcada pela repercussão da Segunda guerra, o
poema traz à tona a posição do autor de forma clara. Trata-se de jovem que ao
receber sua convocação para a guerra, escreve ao presidente da República.
O início do poema é conhecidíssimo: "Senhor presidente, escrevo-lhe uma
carta que o senhor talvez lerá se tiver tempo". Na sequência, o eu lírico
afirma que se recusa a aceitar sua convocação porque não veio ao mundo
para matar pessoas. Além disso, já vira seus irmãos partirem e seu pai
morrer. Em passagem ousada do poema, o eu lírico sugere ao presidente que
vá ele próprio oferecer seu sangue pela pátria, que este seria "bom
apóstolo". Mouloudji (1922-1994) gravará "Le
déserteur", mas solicita modificações. Uma delas diz respeito
à apóstrofe do início que passa a ser "Messieurs qu´on nomme
grands....", em português ficaria algo como "Senhores que
chamamos grandes..." ( infelizmente essa tradução não resgata bem o
sentido, nem o ritmo do verso). Outra alteração incide sobre os últimos versos.
No poema original, o desertor declara estar armado e caso seja preso, admite a
hipótese de atirar nos soldados. Na versão light cantada por
Mouloudji, ao contrário, o jovem avisa que se os soldados o perseguirem,
poderão atirar pois se encontra desarmado. Este belo poema foi traduzido para
dezenas de idiomas e interpretado também por, entre outros, Richard
Anthony, Marc Lavoine e Juliette Gréco.
Le Déserteur
Monsieur le Président
Je vous fais une lettre
Que vous lirez peut-être
Si vous avez le temps
je viens de recevoir
mes papiers militaires
Pour partir à la guerre
Avant mercredi soir
Monsieur le Président
Je ne veux pas la faire
Je ne suis pas sur terre
Pour tuer des pauvres gens
C´est pas pour vous fâcher
Il faut que je vous dise
Ma décision est prise
Je m´en vais déserter
Depuis que je suis né
J´ai vu mourir mon père
J´ai vu partir mes frères
Et pleurer mes enfants
Ma mère a tant souffert
elle est dedans sa tombe
Et se moque des bombes
Et se moque des vers
Quand j´étais prisonnier
On m´a volé ma femme
On m´avolé mon âme
Et tout mon cher passé
Demain de bon matin
Je fermerai ma porte
Au nez des années mortes
J´irai sur les chemins
Je mendierai ma vie
Sur les routes de France
De Bretagne en Provence
Et je dirai aux gens
Refusez d´obéir
Refusez de la faire
N´allez pas à la guerre
Refusez de partir
S´il faut donner son sang
Allez donner le vôtre
vous êtes bon apôtre
Monsieur le Président
Si vous me poursuivez
Prévenez vos gendarmes
Que je n´aurai pas d´armes
Et qu´ils pourront tirer.
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